sexta-feira, 15 de novembro de 2013

cordel chica da silva

CHICA DA SILVA Venham musas do saber Dos recônditos dos Gerais Habitantes das Arcádias De brilhantes minerais Dai-me luz para escrever Estes versos cordiais. Peço às santas protetoras Dos negros da escravidão Santa Ifigênia e do Rosário Como em forma de oração Invocar Chica da Silva Na fé da religião. E quem foi Chica da Silva Senhora sem procedência A mais bela do Tijuco Ou a rainha da opulência? Assim Chica fez causar Uma reação de pungência. No Arraial de Milho Verde Chica da Silva nasceu (1731) Não era negra, e sim parda Como o sol que entardeceu Os seus traços eram finos E bonita ela cresceu. 1 Antônio de Sá, o seu pai, Colono trabalhador Maria da Costa, sua mãe, Africana Inhá de cor Chica uma mulher diferente A marca de seu valor. Francisca veio ao mundo pobre Só conseguiu a liberdade Vivendo em concubinato Com um branco da cidade Ficou rica e conquistou Lugar na sociedade. As mulheres brasileiras Naqueles anos distantes As tidas como brancas Não eram muito elegantes Restavam às negras pardas Serem mais interessantes. Então Francisca da Silva Na boca do diz-que-diz Casa com João Fernandes O mais rico do país Assim a escrava Chica Levava a vida feliz. 2 Contratador de Diamantes: João Fernandes de Oliveira Passa viver em casamento Com a Chiquinha mineira Teve este relacionamento Repercussão brasileira. Pois a Chica que era pobre Logo se vira em um mito E por muitas gerações No fala que fala foi dito E a Chica se transformou Numa boquinha de pito. Mas a Chica também foi Tida como perdulária Devoradora de homens Vida fácil necessária Bruxa anti-religiosa Infecção da malária. Aquela que já foi escrava Em épocas temerárias Passa a ser com o passar Sensível e libertária Sensualidade aflorada Com a negra milionária. 3 Pois Chica da Silva teve Um imenso tudo sem fim Teve igreja ornamentada Com santinho e querubim Teve banda da melhor Com corneta de marfim. Mas a Chica tinha um sonho Um sonho de não acabar Os Gerais ficou pequeno No torrão dela pisar Queria ver a areia branca Queria banhar no mar. O amor de João Fernandes Era tal o soar do apito No encontrar do diamante Muito intenso e bonito Para Chica, o seu amor Era eterno e infinito. Houve um tempo, um tempo negro Em que Chica a negra ativa Por voz da população Teve imagem negativa Tudo por inveja boba Por ser mulata atrativa. 4 A história revelou Que foi pura ingratidão Pois a Chica se casou Com amor no coração Com um branco milionário Realeza da paixão. E Chica, a Chica da Silva Não pisa sem ter tapete Só caminha na liteira Nunca bate com porrete Nada faz, manda fazer Não tolera cacoete. Ninguém já viu seu cabelo Tinha a cabeça rapada Perucas de todas as partes Por ela era comprada Tudo, tudo que queria Era ser mulher amada. E Sá Chica também tinha Dentro dela a maldade Um dia, um escravo humilde Ao espiar sua beldade Mandou castrar o negrinho Soltou-o nu pela cidade. 5 Todo mundo segue Chica Ex-escrava feito menina mucamas, negros, mordomos Vão saudando-a pela esquina No sobe desce ladeira Da Vila de Diamantina. E lá vai Chica da Silva Toda soberba e risonha Diamantes pelo corpo Em liteira de cegonha Ela é a Chica-que-manda No Vale Jequitinhonha. Pois um dia uma negrinha Sorriu para o Contratador Chica da Silva de ciúmes Envermelhou de rancor Mandou arrancar os dentes A negra morreu de dor. Nhá Chica gosta de cama Para dormir e para amar Quando seu amado viajando Ela não sabe levantar Manda as mucamas trazer As delícias do lugar. 6 Chica é parte do movimento Conhecido e tido e tal De Desenvolvimentismo Ufanista Nacional Uma heroína da nascente Redentora racial. Ah, Nhá Chica teve filhos Foram 14 no total Um com o primeiro homem 13 de parto normal Com João Fernandes, seu amor. O ricaço maioral. Então ela tira os seus filhos Da cor e da escravidão, Estudando em Portugal Por aquela ocasião Assim se tornaram como: Filhos de Chica com João. Havia muitas outras Chicas Ex-escravas naturalmente Casadas com homens brancos Poderosos ricamente Outras eram do comércio Trabalhando legalmente. 7 Mas só a Chica despontou Sendo a dama do momento Face do Contratador Homem de forte portento As demais ficaram então Sob o manto do esquecimento. Chica tinha privilégios Cheia de regalidades Pode frequentar igrejas Como também irmandades Foi madrinha de batismos Em muitas localidades. A Rainha de Sabá Chica, cara cor de noite Viveu em plena liberdade Enguarnecida do acoite Feminista libertária Livrou-se cedo do açoite. Nhá Chica quando morreu (1796) Mandaram tocar a banda Missa conga para os negros Despedida com quitanda, E tomou assento no Céu, A alma da CHICA-QUE-MANDA! 8

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