sexta-feira, 27 de junho de 2014
FREI CHICO EM CORDEL
FREI CHICO EM CORDEL
Autor: Olegário Alfredo
Santo Deus onipotente
Arquiteto do Universo
Deixai-me neste cordel
Profundamente imerso
Para que eu possa escrever
E que todos possam ler
Vida de Frei Chico em verso.
O corpo do ser humano
É parecido com uma fresa
Não sendo ele bem cuidado
O malefício o despreza
Se atacado por doença
É preciso que haja crença
Pois só se salva com a reza.
Francisco Van Der Poel
Popularmente, o Frei Chico
Para o povo brasileiro
Carrega a vida no bico
Mistura de homem bicho
Conhecedor de todo nicho
Com alma de tico-tico.
Mil novecentos e quarenta
A data do nascimento
3 de agosto registrado
No livro do sacramento
Do homem, quem traça o destino
Desde cedo pequenino
É Jesus no firmamento.
1
Vindo direto da Holanda
Para o país da mistura
Aporta em tempos de ferro (1968)
Da excomungada ditadura
Onde tudo era proibido
Só se fazia escondido:
Macumba, reza e cultura.
De sorte, o frade holandês
Que era adepto ao Rosário
Foi por ordem franciscana
Traçado seu itinerário
Trabalhar no Araçuaí
E dali não mais sair
Como obreiro missionário.
Vale do Jequitinhonha
Lugar de sofreguidão
Sem lanterna segue o frei
Achar luz na escuridão
Ele sabia que no mundo
Naquele perau profundo
Ser a mais pobre região.
Jesus Salve Frei Chico
Este holandês mineiro
Que ao descobrir um tiquinho
Deste Brasil brasileiro
No Vale Jequitinhonha
Onde o viver é o que sonha
Entendeu-o por inteiro.
2
Tal qual Guimarães Rosa
Andava por todos os lugares
As amizades surgindo
Nas feiras, ruas e lares
Carregando uma caneta
Anotando na caderneta
Os dizeres e cantares.
Pendurado no seu hábito
Um palhaço de boneco
Diz ser seu modo anarquista
Seu pequenino amoreco
Leva o bichim pra todo lado
Palestra, show, batizado
E em cantiga de boteco.
“Eu sou um palhaço de circo”
Diz o frade na sabença
Seu picadeiro são as feiras
E não há quem o desconvença
Tocando seu violão
Botando fé na benzeção
Do jeito que o povo pensa.
A arte popular é um dom
Como também vocação
Pois não existe arte errada
Em qualquer parte ou região
Aprendendo com o velho
Como se fosse um evangelho
Faz parte do coração.
3
E Frei Chico nas andanças
Descobriu pelo sertão
Ser forte o poder do povo
Se brotado pelo chão
Uns vive à mercê de Deus
Estes semelhantes aos seus
Outros na vida do Cão.
- A vida: se sabe, não é fácil,
Vou dizer para vocês
Que Frei Chico faz num dia
Sei que ninguém faz num mês.
O padre ora, toca e canta
O Rumãozinho? Pega e espanta
Com seus caxinguelês.
Tradição oral é sinônimo
De contemporaneidade
O povo sabe pensar
A partir da totalidade
A experiência da vida
Quer seja alegre ou sofrida
Vive na comunidade.
A vida, com sabemos
Da religiosidade
Não deve ser separada
É próprio da humanidade
Seguir por intuição
Através da religião
A cultura desejada.
4
Frei Chico todo é formado
De uma simples beleza
Adora o povo do Vale
Em vez de ver a pobreza
Ver na tradição da fé
Tão bonita que ela é
A sua real riqueza.
O Frei Chico viu no povo
Um grande potencial
Nas canções das lavadeiras
Lavando roupas no quintal
Nas rezas das benzedeiras
Nas festas das brincadeiras
Pega e cria um coral.
Frei Chico sabe falar
A língua do mineirês
Muito culto e poliglota
Fala o latim e holandês
Fala o francês e alemão
Fala a língua do sertão
Ainda o grego mais o inglês.
Seguidor da Teologia
De nome “Libertação”
A favor do socialismo
Da gente de pé no chão
Vê na cultura popular
A força do secular
No bater da pulsação.
5
E Frei Chico também sabe
Valorizar a Rotina
A vida neste mundão
É doce como felina
É o povo no povaréu
Filhos do Papai do Céu
Quem ilumina sua retina.
Frei Chico é um cidadão
Simples e comunicativo
Para a cultura popular
Um grande superlativo
Risonho com todo mundo
Um erudita profundo
Sobretudo criativo.
Foi no Jequitinhonha
O Vale do suspirar
Que mudou no franciscano
O seu modo de pensar
Aprendeu com os mais pobres
Ver a riqueza dos nobres
Na cultura popular.
Disposto a amar vida
Frei Chico na mata embronha
Para quem crer no divino
Não há doença medonha
É o povo quem ensina
A popular medicina
No Vale Jequitinhonha.
6
E foram décadas ouvindo
O bater dos machadeiros
E pelas barrancas do Rio
O cantar dos canoeiros
E pela caatinga do sertão
Segredado em seu surrão
Os aboios dos boiadeiros.
Na roda do benfazejo
O capeta é perverso
Na roda da malvadeza
Jesus Cristo é o inverso
Frei Chico é conhecedor
Aclamado como um doutor
Na arte de jogar verso.
Na hora do padecer
De quem vive no calvário
O coitado ser vivente
Corre e chama o vigário
Junto com a benzedeira
Frei Chico na rezadeira
Quem desembola o Rosário.
Frei Chico se transformou
Num autêntico catrumano
O linguajar do mineiro
Pronuncia sem engano:
Disgramou no quiabar
Está no seu cotidiano.
7
Já publicou vários livros
Na linha do popular
Em escolas especiais
É professor exemplar
Sem saber o corpo reza
E o doutor comum despreza
O que o Frei sabe falar.
Frei Chico um cancioneiro
Da lira do sertanejo
Mais do que religioso
Sabedor do pastorejo
Batina com tabatinga
Do Calhau Velho a Itinga
Do atacado ao varejo.
Lá vai o padre Francisco
Um dos mais sublime artista
Carrega seu povo no bolso
Sem nunca perder de vista
Bodogô de rouco berro
Pés de estrada de ferro
Doce brilho da ametista.
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