segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
Cordel para Clara Nunes - Olegário Alfredo da ABLC
CLARA NUNES
CLARIDADE ETERNA
Olegário Alfredo
A vida que nos rodeia
É feita de brevidade
Viva a vida com alegria
Deixe de lado a vaidade
Nas voltas que o mundo dá
Procure a felicidade.
Tudo está na Natureza
Em perfeito movimento
Num pequeno grão de areia
Existe muito fundamento
Na alquimia do morrer
Faz nascer outro elemento.
Olorum que modupê
Vamos todos saravá
Calara Nunes está na roda
Junto com seu orixá
Gira, que gira girando
No Illê axé opô afonjá.
Vem, que vem linda menina
Vem levantar a poeira
Vamos todos aplaudir
Clara Nunes, a guerreira.
A rainha soberana
Das águas da cachoeira.
1
Assim começa esta história
Numa ventania de agosto
Ano de quarenta e dois (1942)
No céu, um sol bem disposto
De Clara, foi batizada
Pois ser clara, é ter bom gosto.
Num pedaço de sertão
Da paisagem mineira
Cidade antes conhecida
De Cedro da Cachoeira
Paraopeba – Caetanópolis
Designação derradeira.
O pai, Mané Serrador
Cantador e violeiro
Carregava este apelido
Por ser um bom carpinteiro
Nas folias e congadas
Ele sempre pioneiro.
A mãe, Amélia se chamava
Adorava o companheiro
Mas da vida nada se sabe
Veio o destino traiçoeiro
Levou o pai depois a mãe
Ao Superior Terreiro.
2
Órfã desde pequenina
Foi crescendo pela vida
Olhada pelos irmãos
Após triste partida
Assim Clara era feliz
Pois o amor é quem diz
Como curar a ferida.
Nos afazeres de casa
Ajudava suas irmãs
Nas folgas se enfeitava
De muitos balangandãs
E gostava de cantar
Ao alvorecer das manhãs.
Clara gostava de brincar
E não vivia sozinha
Amava suas bonecas
Grandes amigas que tinha
Em suas folgas brincava
Com a meninada vizinha.
E como brincava a pequena
Se deixasse, não tinha hora
Era soltar papagaio
Gangorrar no pé de amora
Montar a cavalo no pêlo
Sem usar sela ou espora.
3
Muito cedo despertou
Gosto pelo Kardecismo
Tinha vida recheada
De forte magnetismo
Eram manifestações
Dentro do espiritismo.
E Clara Francisca escutava
Vozes do tataravô
Do tempo do cativeiro
O grande Babalaô
- Você menina pois é:
Filha de Ogum com Xangô.
Na engrenagem da vida
Vive escondida a surpresa
Ninguém define seu caminho
Nada é certo nem certeza
E por causa de um sucedido
Clarinha se viu indefesa.
Seu namorado pois era
Gente da sociedade
Na fábrica de tecidos (em Paraopeba)
Era máxima autoridade
No, entretanto tinha fama
De mal visto na cidade.
4
A notícia chegou rápida
Em sua terra natal
Mataram seu namorado
Pra preservar sua moral
Clara decepcionada
Muda para a capital.
E lá vai a vida rodando
Empurrando o seu destino
Quem chama o fiel à igreja
São as repicagens do sino
A força que as coisas tem
São presságios do divino.
Tinha pouca experiência
No ramo da tecelagem
A Fábrica da Renascença *
Era a maior em tiragem
Segue Clara para lá
Muita fé em Yemanjá
Com a cara e a coragem.
A vida passada a limpo
Uma nova situação
Trabalhar para o sustento
Cumprir ordem do patrão
Tudo aquilo para Clara
Transmutava uma canção.
5
E assim Clara se empregou
Na fábrica de tecidos
Ainda muito recente
Com os sentimentos doídos
E os apitos da tecelagem
Ferindo os seus ouvidos
Viu-se cair na rotina
O que jamais ela queria
Pois cantar era seu dom
E de certo isto faria
Forças vindas do distante
Toda hora ela sentia.
Problemas familiares
Deixavam-na transtornada
Mesmo assim Clara encontrava
Força tamanha e encantada
Em continuar trabalhando
E viver sempre sonhando
Em ser cantora afamada.
E foi no coral da igreja
Que teve oportunidade
Em mostrar a bela voz
Naquela localidade
Cantou como um rouxinol
E com naturalidade.
6
Esta data representou
Um salto para o futuro
E uma luz no fim do túnel
Fez clarear o escuro
Clara viu naquela hora
Gosto do fruto maduro
Recebe de bate pronto
Um convite salutar
E na Rádio Inconfidência
Já poderia a cantar
As portas da felicidade
Deu sinal pra não fechar.
E lá vai a vida prosseguindo
O seu natural percurso
Clara muito obstinada
Mesmo com pouco recurso
Vence “A VOZ DE OURO ABC” *
O concorrido concurso.
Logo então a mineirinha
Ver subir sua moral
Cantando em casas noturnas
No centro da Capital
Muito rápido viu chegar
A projeção nacional.
7
Logo assim um bom amigo
Do balaio jornalístico
A propõe mudar de nome
Para que seja mais artístico
Muda para Clara Nunes
Nome forte e muito místico.
Olurum é quem governa
O Universo por inteiro
São Jorge que é Ogum
É quem manda no terreiro
Clara Nunes cai na vida
Com fé no seu padroeiro.
E lá vai a mineirinha
Rumo ao Rio de janeiro (1965)
Contratada pela Odeon
Sonhando em ver dinheiro
Boleros e sambas-canções
Músicas de seu roteiro.
Logo vem outro LP (1968)
“Você Passa Eu Acho Graça”
Grande sucesso de fato
Estourou por toda praça
Pois o samba era seu dom
Que de cabeça ela abraça.
8
E Clara Nunes pois era
Uma mulher incomum
Seu corpo comunicava
Era de quebrar o jejum
Sua voz emocionava
O seu perfume exalava
A beleza pura de Oxum.
Clara Nunes pelos palcos
Era de impressionar
Transmitia verdade
Possuía ímã no olhar
Era mesmo uma explosão
Tinha determinação
No começo do cantar.
Mulher de senso prático
E toda ela sincrética
Na Umbanda ou Candomblé
Carregava a mesma ética
No Católico ou Kadercismo
Mostrando seu sincretismo
Na mesma linha estética.
Com tamanhas qualidades
Esta sobrenatural
Clara ganha relevância
No cenário musical
Agrega ritmos populares
Frenquenta todos os lugares
Uma mulher sem igual.
9
Descobre sozinha que
Na vida não tem segredo
Caminhando para frente
É que vai perdendo o medo
Pois foi ela a primeira dama
A gravar sambas-enredo.
E temos Clara Nunes
Do Brasil, a voz mais bela
A sua grandeza a fez
Desfilar na passarela
Dando brilho colossal
No gigante carnaval
Lá na Escola da Portela.
A partir deste momento
No auge de sua carreira
Lança mais um elepê (1971)
Só com músicas de primeira
Clarinha torna-se então
Totalmente brasileira.
Em seguida veio o sucesso
Com o disco alvorecer (1974)
Mais de 500 mil cópias
Pôs-se rápido a vender
Foi a primeira brasileira
Esta conquista receber.
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Clara Nunes fez de tudo
Com amor e serenidade
Subiu no palco com brilho
Sem pecado ou vaidade
Inaugurou um teatro
De sua propriedade.
Viajou pelo mundo afora
Influenciou gerações
Transitava sem preconceito
Em todas religiões
Sabemos que neste mundo
Não há segundo sem primeiro
Clara Nunes na caçada
Com seu tiro bem certeiro
Realiza o casamento
Com Paulo César Pinheiro.
Um grande compositor
Um bruxo visionário
Um poeta de primeira
Um valente missionário
E junto com Clara vão
Rompendo o fuso-horário.
Naturalmente gravaram
Diversas composições
Os sambas foram parar
Em outras tantas nações
Sempre da mesma maneira:
Explodindo corações.
Clara Nunes foi portanto
Carismática e muito bela
O seu cantar parecia
Ser uma oração singela
Da terra subia ao Céu
Em formato de aquarela.
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Clara Nunes fez de tudo
Com amor e serenidade
Subiu no palco com brilho
Sem pecado ou vaidade
Inaugurou um teatro
De sua propriedade.
Viajou pelo mundo afora
E por todas regiões
Transitou sem preconceito
Por todas religiões
Fez sorrir e fez chorar
Os mais puros corações.
A vida como sabemos
Nada mais é que surpresa
Clara Nunes num só segundo
Estava muda e indefesa
- Se a ceia estava servida
A uma pessoa tão querida
Por que tiraram a mesa?
Morrer acontece, sabemos
Toda morte deixa dor
Tão cedo Clara subiu
Para o Andar Superior
E por lá vive cantando
Junto de Nosso Senhor.
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