sexta-feira, 15 de novembro de 2013
cordel os gaiolas do rio são francisco
OS GAIOLAS
DO RIO SÃO FRANCISCO
Neste cordel eu me vejo
Passeando pela história
Escrevendo pouco a pouco
O que trago na memória
Sobre o Rio Francisco
Um marco feito de glória.
Antes porém é preciso
Acrescentar na introdução
A história do São Francisco
Grande rio da Nação
A importância que ele tem
Em toda sua extensão.
Chamado de Velho Chico
Este rio feito de encanto
Por cinco estados ele cruza
Leva seu sagrado manto
Distribuindo alimentos
Em nome do mesmo Santo.
Em mil e quinhentos e um
Deu-se o Rio por descoberto
Foi com Américo Vespúcio
Um navegador esperto
Pressentia que a riqueza
Dele estava muito perto.
1
Já os índios da região
De sabença secular
De “Opara” chamavam o rio
Que significava “Rio-Mar”
O homem branco lá chegando
Os índios profetizando:
- Este rio vai-se acabar.
Lindamente o São Francisco
Nasce nas terras mineiras
Formados de águas mansas
E também de corredeiras
Um rio cheio de histórias
E de lendas brasileiras.
Portanto o velho Chico
Um rio feito de curriola
Onde se come um bom pescado
Ao som alegre da viola
E a saudade vem surgindo
Das viagens no Gaiola.
O Gaiola é no Brasil
Um tipo de embarcação
Que navega pelo rio
De uma certa região
Levando gente ribeirinha
Do cerrado e do sertão.
Disse o velho gaioleiro
Um ditado interessante:
Que navegar é preciso
Viver não é semelhante
Um rio corre naturalmente
Devagar, chega a diante.
2
A primeira embarcação
Para o povo ribeirinho
Apelidado de Gaiola
Retribuição de carinho
Batizado pelo nome:
Barco SALADANHA MARINHO.
Foi importante este barco
Para o baiano e mineiro
Com apito rouco e estridente
De longe ouvia o viageiro
Tinha como itinerário,
Pirapora a Juazeiro.
A segunda embarcação
Em viagens por águas santas
No leito do São Francisco
Margeando belas plantas
Este barco conhecido:
Como o PRESIDENTE DANTAS.
A lancha CEZÁRIO foi
A terceira a navegar
Pelas águas do Velho Chico
Viajava sem parar
Um gaiola pro comércio
Das pessoas do lugar.
SÃO PAULO o quarto vapor
Teve vida temporária
Era voltado para pesca
E para agropecuária
Sem explicação sumiu
Do Porto de Januária.
3
ANTÔNIO DO NASCIMENTO
Este foi o quinto vapor
Pirapora a Bom Jesus
Deslanchava o roncador
Tinha porte mediano
E um reforçado motor.
O barco ALFREDO VIANA
Outro de grande valor
Impulsionado por hélice
Nas águas era um trator
Transformado em gaiola
Passa a chamar SALVADOR.
O mais velozes dos gaiolas
De nome MATA MACHADO
Também foi o mais possante
Tinha o casco achatado
Levava gente importante
Nunca ficando encalhado.
Vem o ENGENHEIRO HALFED
O maior do São Francisco
Era bastante imponente
Andava sem correr risco
Tinha até segunda classe
O gaiola mais arisco.
O vapor MELO VIANA
De belíssimos patamares
Levava grandes toneladas
Para todos os lugares
Teve o nome substituído
Por gaiola RAUL SOARES.
4
Tinha o nome de SÃO FRANCISCO
O vapor da integração
Carregou gente importante
Do mais alto escalão
Um incêndio inesperado
Casou sua destruição.
É bonito ver passar
Qualquer dia qualquer hora
O BENJAMIM GUIMARÃES
Na cidade de Pirapora
No mundo não há quem tenha
Um vapor movido à lenha
Ao rompimento da aurora.
O gaiola Benjamim
É de se encantar qualquer vista
Nele pode passear
Do Governador ao artista
Um patrimônio mundial
À espera do turista.
O BARÃO DE COTEGIPE
O gaiola da saudade
De apito melodioso
Alegria da cidade
Abandonado em Pirapora
Sem a menor piedade.
Até hoje os barranqueiros
Lamentam tal descaso
O barco foi abandonado
Num banco de areia raso
Culpa da administração
Ignorância do atraso.
5
Vem o FERNANDES CUNHA
Construído em Juazeiro
Tinha uma máquina moderna
Navegava bem ligeiro
Queimado em Matias Barbosa
Em território mineiro.
O CORDEIRO DE MIRANDA
Um barco muito imperfeito
Duas vezes naufragou
Por ser alto e muito estreito
Muitas pessoas morreram
Por causa do tal defeito.
Um dos melhores vapores
Foi o WENCESLAU BRAZ
O gaiola dos turistas
Perfeito no leva-e-traz
Veio a sofrer um naufrágio
Saiu fora do cartaz.
O gaiola FERNÃO DIAS
Na Inglaterra fabricado
Nas águas do São Francisco
Com cuidado foi lançado
Sem justa explicação
Também foi incendiado.
O gaiola ANTÔNIO OLINTO
Origem desconhecida
Na revolução de 30 (1930)
Teve a triste despedida
Navegava no São Francisco
Muito tira perdeu a vida.
6
O SANTA CLARA, outro gaiola
Que o caboclo d’água levou
Nas águas do Velho Chico
Em 32 naufragou
Morrendo várias pessoas
Só a saudade restou.
O gaiola CORONEL RAMOS
Barco cheio de nove hora
Era pertencente da,
Viação de Pirapora
E como os demais gaiolas
Pro ferro velho foi embora.
Agora o FRANCISCO BISPO
Nome dado em homenagem
Ao melhor de todo o Vale
De mecânica de engrenagem
Um gaiola interessante
Encantador de passagem.
O gaiola SERTANEJO
Rebocava duas chatas
O Piriquitinho Verde
Era das cores da mata
Pelo Rio São Francisco
Viajou por poucas datas.
Origem desconhecida
O GOVERNADOR VALADARES
Antes de ser ferro velho
Naufragou em vários lugares
Um gaiola misterioso
Semelhante aos lupanares.
7
O gaiola AFONSO ARINOS
De origem desconhecida
Também sofreu naufrágio
Nesta cena repetida
Ferro velho o destino
Mais um fora da vida.
Agora o PARACATUZINHO
Barco de pequeno porte
Um gaiola naufragado
Bem em Minas, lá no Norte
Ninguém neste não morreu
Caboclo d’água deu a sorte.
Vem o JURACY MAGALHÃES
O maior vapor da frota
Só em rio cheio navegava
Para não perder a rota
Abandonado em Juazeiro
Teve a sua vida morta.
Outros gaiolas no cordel
Como o COSTA PEREIRA
Naufragou em Pirapora
Em plena terra mineira
NILTON PRADO e RODRIGO SILVA
Foram da mesma maneira.
Agora pra terminar
COSTA E SILVA eu enumero
Junto com o JUAREZ TÁVORA
Gaiolas de grande esmero
De soma aos desmantelos
Nossa história vai a zero.
8
Fim – 19/10/2013.
cordel chica da silva
CHICA DA SILVA
Venham musas do saber
Dos recônditos dos Gerais
Habitantes das Arcádias
De brilhantes minerais
Dai-me luz para escrever
Estes versos cordiais.
Peço às santas protetoras
Dos negros da escravidão
Santa Ifigênia e do Rosário
Como em forma de oração
Invocar Chica da Silva
Na fé da religião.
E quem foi Chica da Silva
Senhora sem procedência
A mais bela do Tijuco
Ou a rainha da opulência?
Assim Chica fez causar
Uma reação de pungência.
No Arraial de Milho Verde
Chica da Silva nasceu (1731)
Não era negra, e sim parda
Como o sol que entardeceu
Os seus traços eram finos
E bonita ela cresceu.
1
Antônio de Sá, o seu pai,
Colono trabalhador
Maria da Costa, sua mãe,
Africana Inhá de cor
Chica uma mulher diferente
A marca de seu valor.
Francisca veio ao mundo pobre
Só conseguiu a liberdade
Vivendo em concubinato
Com um branco da cidade
Ficou rica e conquistou
Lugar na sociedade.
As mulheres brasileiras
Naqueles anos distantes
As tidas como brancas
Não eram muito elegantes
Restavam às negras pardas
Serem mais interessantes.
Então Francisca da Silva
Na boca do diz-que-diz
Casa com João Fernandes
O mais rico do país
Assim a escrava Chica
Levava a vida feliz.
2
Contratador de Diamantes:
João Fernandes de Oliveira
Passa viver em casamento
Com a Chiquinha mineira
Teve este relacionamento
Repercussão brasileira.
Pois a Chica que era pobre
Logo se vira em um mito
E por muitas gerações
No fala que fala foi dito
E a Chica se transformou
Numa boquinha de pito.
Mas a Chica também foi
Tida como perdulária
Devoradora de homens
Vida fácil necessária
Bruxa anti-religiosa
Infecção da malária.
Aquela que já foi escrava
Em épocas temerárias
Passa a ser com o passar
Sensível e libertária
Sensualidade aflorada
Com a negra milionária.
3
Pois Chica da Silva teve
Um imenso tudo sem fim
Teve igreja ornamentada
Com santinho e querubim
Teve banda da melhor
Com corneta de marfim.
Mas a Chica tinha um sonho
Um sonho de não acabar
Os Gerais ficou pequeno
No torrão dela pisar
Queria ver a areia branca
Queria banhar no mar.
O amor de João Fernandes
Era tal o soar do apito
No encontrar do diamante
Muito intenso e bonito
Para Chica, o seu amor
Era eterno e infinito.
Houve um tempo, um tempo negro
Em que Chica a negra ativa
Por voz da população
Teve imagem negativa
Tudo por inveja boba
Por ser mulata atrativa.
4
A história revelou
Que foi pura ingratidão
Pois a Chica se casou
Com amor no coração
Com um branco milionário
Realeza da paixão.
E Chica, a Chica da Silva
Não pisa sem ter tapete
Só caminha na liteira
Nunca bate com porrete
Nada faz, manda fazer
Não tolera cacoete.
Ninguém já viu seu cabelo
Tinha a cabeça rapada
Perucas de todas as partes
Por ela era comprada
Tudo, tudo que queria
Era ser mulher amada.
E Sá Chica também tinha
Dentro dela a maldade
Um dia, um escravo humilde
Ao espiar sua beldade
Mandou castrar o negrinho
Soltou-o nu pela cidade.
5
Todo mundo segue Chica
Ex-escrava feito menina
mucamas, negros, mordomos
Vão saudando-a pela esquina
No sobe desce ladeira
Da Vila de Diamantina.
E lá vai Chica da Silva
Toda soberba e risonha
Diamantes pelo corpo
Em liteira de cegonha
Ela é a Chica-que-manda
No Vale Jequitinhonha.
Pois um dia uma negrinha
Sorriu para o Contratador
Chica da Silva de ciúmes
Envermelhou de rancor
Mandou arrancar os dentes
A negra morreu de dor.
Nhá Chica gosta de cama
Para dormir e para amar
Quando seu amado viajando
Ela não sabe levantar
Manda as mucamas trazer
As delícias do lugar.
6
Chica é parte do movimento
Conhecido e tido e tal
De Desenvolvimentismo
Ufanista Nacional
Uma heroína da nascente
Redentora racial.
Ah, Nhá Chica teve filhos
Foram 14 no total
Um com o primeiro homem
13 de parto normal
Com João Fernandes, seu amor.
O ricaço maioral.
Então ela tira os seus filhos
Da cor e da escravidão,
Estudando em Portugal
Por aquela ocasião
Assim se tornaram como:
Filhos de Chica com João.
Havia muitas outras Chicas
Ex-escravas naturalmente
Casadas com homens brancos
Poderosos ricamente
Outras eram do comércio
Trabalhando legalmente.
7
Mas só a Chica despontou
Sendo a dama do momento
Face do Contratador
Homem de forte portento
As demais ficaram então
Sob o manto do esquecimento.
Chica tinha privilégios
Cheia de regalidades
Pode frequentar igrejas
Como também irmandades
Foi madrinha de batismos
Em muitas localidades.
A Rainha de Sabá
Chica, cara cor de noite
Viveu em plena liberdade
Enguarnecida do acoite
Feminista libertária
Livrou-se cedo do açoite.
Nhá Chica quando morreu (1796)
Mandaram tocar a banda
Missa conga para os negros
Despedida com quitanda,
E tomou assento no Céu,
A alma da CHICA-QUE-MANDA!
8
terça-feira, 12 de novembro de 2013
CORDEL AS NOIVAS DO CORDEIRO
CORDEL
AS NOIVAS DO CORDEIRO
Autor: Olegário Alfredo
Na grande lei do Universo
Não há segundo sem primeiro
O bicho homem é complicado
Mas pode ser justiceiro
Peço luz para escrever
Sobre as Noivas do Cordeiro.
São cinco horas da manhã
O galo ainda no poleiro
Lá se pondo a cocoricá
Embelezando o terreiro
Chamando pra despertar
Sim, as Noivas do Cordeiro.
As mulheres do lugar
Muito cedo estão de pé
Levam as crianças para escola
Logo após tomar café
Sempre livres e felizes
Essa é a profissão de fé.
Mas antes nada era assim
O sofrer já dissipou
O peito guarda a tristeza
Do mal tempo que passou
Foi com Maria Senhorinha
Quando tudo começou.
1
Mil oitocentos noventa
A data do marco zero
Assim pipoca essa história
Entre tanto lero-lero
O desandar deste fato
Foi um complicado bolero.
A Maria Senhorinha
Estava recém casada
Com o francês Arthur Pierre
Roças Novas era a morada
Distrito de Belo Vale
Pelo caminho da estrada.
Com três meses de casório
Resolveu se separar
Une-se com Chico Fernandes
Homem simples do lugar
O povo escandalizado
Pôs-se logo a marretar.
E dessa louca união
Muito, muito combatida
Senhorinha veio a formar
Uma família querida
Oito filhos consagrados
Exemplo de fé na vida.
2
Francisco, o filho primeiro
Vem Maria Matozinho
Genoveva com Vicente
Seguem no mesmo caminho
Geralda, Beniga, Antônia
Com Ramiro mais carinho.
A união de Senhorinha
Teve má repercussão
A igreja do catolicismo
Fez a excomungação
Para toda a sua família
Até a quarta geração.
Francisco Fernandes Filho
O primeiro do casal
Casa com Geralcina
Filhos 12 no total *
Destaca a filha DELINA
A matriarca do local.
O preconceito reinante
Que acompanhou senhorinha
Juntamente com seus filhos
Foi praga de erva daninha
Vai para geração seguinte
A dor cega que caminha.
3
E por várias gerações
Esta chaga foi marcada
Obrigando-os a viver
De forma mais que isolada
Sem contato com ninguém
Vida triste segregada.
Tidas como prostitutas
Cruel discriminação
Muita dor com sofrimento
Tempo de desolação
Preconceito em toda parte
Contaminou a região.
Vida constante sofrida
Seguida de vexatório
Em qualquer parte ou lugar
O mesmo repetitório
Já foram apedrejadas
Até mesmo em velório.
Para as Noivas do Cordeiro
Vem à fase crucial
Pelos anos de 40 (1940)
Eis que chega no local
Um pastor evangélico
Um cordeiro corporal.
4
De nome Anísio Pereira
Um evangelizador
Frequenta a comunidade
Como um consolador
Mas foi um oportunista
Sabendo ser fingidor.
Resolve o pastor Anísio
Com DELINA se casar
Tinha ela 16 anos
De sonhos a suspirar
Ele com 43
Experiência a esbanjar.
Ergue a igreja evangélica
Naquela comunidade
Foi ironia do destino
Ou o acaso da falsidade
Pois de Noiva do Cordeiro
Batiza a localidade.
E dessa união casalar
Como ninho de novilhos
Nascem na comunidade
Um total de doze filhos
E os problemas vão surgindo
Nas pausas dos estribilhos.
5
E começa este pastor
A sua evangelização
Todo mundo vira crente
Na pequena região
Assim vivem iludidas
As moças do casarão.
O isolamento vivido
Pelas gerações passadas
Veio a tornar mais aguda
E as crises mais acirradas
Pelas regras rigorosas
Pelo pastor aplicadas.
A dor da segregação
Preconceito por inteiro
Tristeza, desolação
Jejum, falta de dinheiro
Marca da Comunidade
Lá na Noiva do Cordeiro.
A esperança de mudança
Começa já acontecer
Foi nos idos de 90 (1990)
Coração não quer sofrer
Diz a voz interior
Temos a vida pra viver.
6
E as Noivas do Cordeiros
Despertaram a questionar
Sobre as regras ali impostas
E a doutrina do pensar
E que dali para frente
A alegria iria a reinar.
Tudo foi num casamento
Que a alforria começou
Uma filha de Delina
Em uma noite sonhou:
- Ter música na igreja
E que o povo todo veja
E o sonho realizou.
Muitos jovens do local
Não sabiam o que era dança
Passavam a vida a perder
A infância da criança
O ápice deste casamento
Foi o germinar da bonança.
E neste dia dançaram
Como sendo carnaval
Se livraram do fantasma
De seu pecado carnal
Extinguiram para sempre
Aquela igreja local.
7
Nunca mais religião
Institucionalizada
Nem católica nem evangélica
Como outra profetizada
A liberdade por lá
Por Deus foi proclamada.
Lá nas Noivas do Cordeiro
As moças são a maioria
Elas aram e amam a terra
Trabalham em harmonia
Sabem ordenhar as vacas
Tarefa de todo dia.
Tecem tapetes e colchas
Dos porcos sabem cuidar
Criam lindas lingeries
Mão de fada a trabalhar
Não querem jamais perder
O grande poder de amar.
Como as mulheres de Athenas
Trabalham no seu lugar
Os homens vão pra longe
Em busca do labutar
Nas folgas, voltam sedentos
E com elas vão amar.
8
segunda-feira, 23 de setembro de 2013
quarta-feira, 3 de julho de 2013
O MONSTRO DE ITAMARANDIBA
O MONSTRO DE ITAMARANDIBA
Autor: Olegário Alfredo – veja a página: www.olegarioalfredo.com.br
Vou contar para meu filho
Tudo que ouvi de meus pais
Assim com o passar do tempo
Não esqueceremos jamais.
O caso que vou contar
É mesmo de arrepiar
Desde nossos ancestrais.
Tem coisas por este mundo
Que existem de verdade
Não é folclore nem crendice
É pura veracidade
Pegue com Deus a rezar
E a maldade te livrar
Do mundo da crueldade.
Os monstros são criaturas
Vindos da imaginação
Povoam nossas cabeças
Conforme a superstição
Temos monstros populares
Visto por todos os lugares
Provocando assombração.
Há muitos anos atrás
No tempo da escravatura
Os casos eram contados
E não lidos na escritura
Tinha monstro horroroso
Grandalhão e pavoroso
E nada de formosura.
1
Existe um monstro medonho
De causar dor de barriga
Há muito tempo ele vive
Lá por Itamarandiba
O seu modo assustador
Causa espanto e causa horror
Quem zombar de sua vida.
Este monstro sempre é visto
No Vale Jequitinhonha
Ele é gordo feito porco
E de uma cara medonha
As crianças da região
Se dormir sem oração
Suam frio pela fronha.
Pois agora vou contar
Como surgiu este monstro
O seu modo de agir
A vocês logo demonstro
Quem for a Itamarandiba
Sem rezar reza comprida
Irá direto a seu encontro.
Conta-se que certa vez
Um ricaço fazendeiro
Desentendeu com o vigário
Por causa de bom dinheiro
O padre por natureza
Entendendo a safadeza
Deu uma de mandingueiro.
2
O fazendeiro abriu a boca
Maldizendo do vigário:
Você é gordo feito mula
Come até fora do horário.
Logo digo sem temer
Que o padreco também crer
É no dinheiro do operário.
Coitado do fazendeiro
Ao dizer o que não devia
Sua vida virou inferno
A partir daquele dia
Pois o vigário no ofício
Representa Jesus Cristo
No altar da sacristia.
Vou dizendo os sucedidos
Caso de monstruosidade
Cometidos pelo monstro
Pelas ruas da cidade
O monstro só quer vingar
Pondo logo a assustar
Todos da comunidade.
O vigário rancoroso
Disse para o fazendeiro:
Vou rogar-lhe uma praga
Bem pior que feiticeiro
- Comerás tudo pela frente
Calango, sapo e serpente
E sola de sapateiro.
3
E o vigário não parou
E mais praga foi jogando:
- Fazendeiro excomungado
O pior está lhe esperando
Se você quiser saber
De tão gordo vai morrer
Com a barriga estourando.
E no dia de seu enterro
Para puxar o caixão
Só com um carro de boi
De oito juntas pelo chão
E o corpo bem enterrado
Na Matriz do padre amado
Para não pedir perdão.
Pois lá dentro da igreja
O monstro não fugiria
O seu corpo lá enterrado
Muito guardado ficaria
De modo dessas razões
E o poder das orações
Da Matriz não sairia.
E o homenzarrão foi comendo
Foi comendo, foi comendo
E o seu corpo a cada dia
Foi crescendo foi crescendo
Comia tudo pela frente
Até fruta com semente
Pelo bucho ia descendo.
4
Contam o povo da cidade
Que primeiro devorou
Os mantimentos guardados
Que pela frente encontrou
Até jaca com o talo
Direto pro seu gargalo
O monstrengo empurrou.
O monstro também comeu
Todas frutas do quintal
As verduras lá da horta
Era o prato principal
Comeu tudo sem cheirar
E tão pouco examinar
Sem nada lhe fazer mal.
Em seguida comeu os bois
O cavalos e as galinhas
Porcos, burros e os cabritos
E até as ervas daninhas
E com tanta comilança
Já quase poucando a pança
Peidava enxofre e murrinha.
E não parou de comer
Comeu os bichos dos arredores
Veados, pacas e tatus
Comeu até bichos menores.
Os bichos chegando ao fim
Comeu cela, cabresto e capim
Comeu lama e trem piores.
5
Pesando mais de mil quilos
E rosnando feito cão
O monstro representava
O terror da região
Já pensando em comer gente
Espingolu-se de repente
Caiu morto pelo chão.
Para fazer o caixão
Tão grande e descomunal
Muitas toras de braúnas
Trouxeram para o local
E o corpo muito pesado
Para fora foi puxado
Com carro-de-boi real.
Quem for a Itamarandiba
Observe bem pelo chão
Verás as marcas da roda
Com tamanha perfeição
Que o carro-de-boi deixou
E o tempo nem apagou
O traço da maldição.
Com muita dificuldade
O enterraram na Matriz
Surgiram coisas medonhas
Na boca do diz-que-diz.
A população amistosa
E também religiosa
Foi sentindo se infeliz.
6
E coisas misteriosas
Começaram a acontecer
Rachaduras nas paredes
O fiel podia ver
Até o cabelo do bicho
O padre punha no lixo
Para ninguém perceber.
Ainda não faz muito tempo
Que a Matriz colonial
Fora toda destruída
Por um incêndio infernal
Só podia ser o Cão
Dando a sinalização
Que ele vive no local.
Ungido pelos poderes
Da Santa Cruz no altar
O frei jogava água benta
Para o monstro sossegar
Mesmo hoje na igreja ova
Esta cena se renova
Perante a qualquer olhar.
E o monstro não parou mais
De assustar a região
Havia defronte a igreja
Um pé de cedro fortão
Um dia sem novidade
Na rotina da cidade
O cedro pocou no chão.
7
Se o bicho sair da cova
Como reza a maldição
Comerás tudo pela frente
Até a sétima geração
Para livrar deste horror
Só água benta do Senhor
E com o poder da oração.
Até hoje ainda se vê
Saindo das rachaduras
Do assoalho da igreja
Formigada e tanajura
Diz o povo do lugar
Pra este monstro sossegar
Só mesmo com benzedura.
O monstro da região
Também tem companhia
A mulher de cinco metros
Ser sua prima ele dizia
Em noites de lua cheia
Pela igreja ela rodeia
Em busca de arrelia.
Vou contar para meu filho
Tudo que ouvi de meus pais
Assim com o passar do tempo
Não esqueceremos jamais
O caso que acaba assim
Vem do tempo do sem-fim
Lá de nossos ancestrais.
8
Postado por Olegário Alfredo às 15:38 Nenhum comentário:
quinta-feira, 29 de março de 2012
cordéis de minas
LEIA NESTE BLOG OS CORDÉIS:
CLUBE DA ESQUINA - SER MINEIRO e CELSO CUNHA
VISITE A:
Cordelteca Olegário Alfredo - Sabará -MG
A Cordelteca Olegário Alfredo (Mestre Gaio), está localizada na Cidade de Sabará-MG, nela se encontra um expressivo acervo de cordéis de vários autores do Brasil, com também matrizes de xilogravuras e livros sobre o assunto. Olegário Alfredo é Membro da ABLC - Academia Brasileira de Literatura e da ALTO – Academia de Letras de Teófilo Otoni. Com mais
De 100 títulos de cordéis publicados.
Veja a página: www.olegarioalfredo.com.br e o blog: www.cordeldeminas.blogspot.com
Assinar:
Postagens (Atom)